sábado, 30 de outubro de 2010

A vida da Morte

Hoje seria dia de aniversário caso a Morte não tivesse aparecido antes do tempo. Malograda esta vida composta de morte.

Aqui vai um excerto do que será publicado na próxima edição da Voz de Mira:

"A vida da Morte…

A vida da Morte é tristonha. A vida da Morte anda rodeada de tristeza. A vida da Morte transforma-nos em seres tristes.
Ela, a Morte, anda por aí, sempre andou, sempre andará. Ela despe-se de feição e só se mostra quando um determinado corpo já não transmite vida. A Morte é cruel.
A Morte e a Natureza são elementos da Vida, e quantas vezes a Morte não tira vida à Natureza.
Em dias gélidos de Inverno a Morte cuida de tirar a vida a uma frágil flor; pensemos, conscientemente, numa rosa. Uma rosa que, para os humanos, pode ter simbologia tão diversa – da paixão à política –, porém, para a Morte essa simbologia é tão desinteressante como desrespeitada. Ela absorve insensivelmente a vida da rosa nos dias frios, argumentando-se casuisticamente na fisiologia da espécie, e assim, a vida de uma rosa morre: perde a cor, perde o perfume, perde a sua essência.
Em dias de abrasivos de Verão a Morte cuida de tirar a vida a uma sedenta águia; pensemos, conscientemente, numa águia sem raça mas com espírito, uma águia livre como aquelas que pairam no imaginário das pradarias. Falamos de uma águia cheia de vida e de necessidade de vida, uma águia resistente, tantas vezes maltratada pela Vida mas sempre ripostando com vida. Infelizmente, para aquela águia e para quem a sua vida também trazia vida, aquele Verão foi seco e quente demais. A morte saiu à rua (como o José Afonso lá cantarolava, antes de a Morte o visitar precocemente) de novo e, desta vez, foi retirando lentamente vida até à pobre águia não poder voar mais, acabando esta por rogar à Morte para ocupar o seu lugar naquele corpo sem vida.

Choque!"

1 comentário:

Luciana disse...

Passei por aqui e encontrei este post... tenho um nó na garganta que ainda não se desfez bem e sei que não sou a única. A morte é tão brutalmente absurda que nunca seremos capazes de entender porque vem e a quem vem. Porque na verdade só vem para deixar um rasto de vazio. Que estejas bem, beijo